QUER SABER MAIS SOBRE MACONHA? INFORMAÇÃO NUNCA É DEMAIS!
- Marcos Brito Psicólogo
- 3 de set. de 2020
- 8 min de leitura

Na minha trajetória com atendimento na área de Dependência Química, existe uma prevalência de pacientes que utilizam maconha, bem como, familiares que estão desinformados sobre tal questão.
Quase que constante, a apologia a maconha é um clichê dos usuários. Então, decidi redigir este texto para informar as consequências danosas do uso. Para isto, busquei diversas pesquisas, pois quando relato determinadas circunstâncias aos usuários, sempre me deparo com argumentações do senso comum, vazias e cheia de ideologias com “ditos” benéficos.
Maconha é o nome popular de uma planta da espécie Cannabis sativa, uma de muitas. Também chamada de erva, baseado, cigarrinho do capeta, marijuana, beque, broto, Mary Jane e um grande número de outras gírias. É classificada como substância perturbadora do Sistema Nervoso Central (SNC) e esta classificação é dada por mexer com a psiquê e, não raramente, produzir alucinações e delírios.
A Cannabis sativa contém mais de 100 compostos diferentes conhecidos como canabinóides, sendo os mais abundantes o delta-9-tetrahidrocanabinol (THC) e o canabidiol (CBD). O THC é o principal princípio ativo que produz o “barato” e que os usuários buscam. (UNITED NATIONS, 2020)
Quando a maconha é fumada, o THC e outros produtos químicos da planta passam dos pulmões para a corrente sanguínea, que os carrega rapidamente por todo o corpo até o cérebro. Para muitos, ela causa euforia, alterações sensoriais, uma sensação de descontração, alterações da percepção do tempo, hilaridade, aumento de apetite e uma relação de acreditar que está em uma boa. Este último, podemos categorizar como efeito mais perverso, o qual leva a dependência ao longo da história de uso.
As experimentações não são somente prazerosas, como muitos defendem. Usuários apresentam crises de ansiedade, alucinações, perda do senso de identidade pessoal, medo, déficits de memória, diminuição da atenção e concentração, profunda sensação de tristeza, isolamento de grupos, delírios persecutórios, pensamentos míticos, depressão, desconfiança ou até ataques de pânico.
Diferente de outras substâncias, como bebidas alcoólicas quando utilizadas além da conta, o sujeito se percebe muito alterado se dando conta disto e, quando o efeito passa, existe um desconforto, porém na maconha o sujeito acredita que depois do efeito mais intenso passar, ele estará desintoxicado e tudo voltará ao normal, porém isto é ilusório, pois quando os níveis de substâncias no organismo são medidos, ainda existem índices de toxidade significativos, após 24 horas.
Devido a esta ilusão a pessoa vai se modificando tão lentamente que não se dá conta. Caso você conheça alguém que faça uso desta substância, perceba se existiu alguma modificação em atitudes do cotidiano. Exemplificando, nas atividades escolares ele vai mal; irritação por coisas simples; sonolência excessiva; falta de motivação para atividades, quando antes eram prazerosas; troca o dia pela noite; diminuição da libido; dentre outras. As chances deste usuário acreditar que sempre foi assim, torna-se discurso como justificativa de uso, isto já é um dos indícios de dependência.

Um estudo ocorrido por algumas décadas com acompanhamento de bebês, até eles atingirem a fase adulta, trouxe uma série de respostas para algumas apologias feitas na defesa da maconha. Uma das observações das amostras, entre o grupo que utilizava maconha em um determinado grau e o que não utilizava, é que os usuários tinham menos relações amorosas estáveis, mais utilização de amparo previdenciário, menos emprego, renda mais baixa, provocavam mais acidentes de trânsito, tinham menos diplomas universitários, comportamento criminoso e menor satisfação com a vida. Neste estudo existiu um questionamento sobre felicidade, a resposta dos usuários de maconha, mesmo contraditórias com os fatos, era a crença de que eram mais felizes. Assim uma das conclusões é que o usuário de maconha tinha uma ilusão da percepção de si mesmo.(FERGUSSON, BODEN, & HORWOOD, 2015)
A utilização desta substância provoca déficits de aprendizagem, afeta a memória, a atenção e a capacidade motora de forma agressiva. A pesquisa, publicada na Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, demonstrou que a utilização da maconha na adolescência causa declínio neuropsicológico amplamente em todos os domínios de funcionamento na idade adulta, com redução em média de oito pontos no QI (Quociente de inteligência). Além disso, a interrupção do uso de cannabis não restaurou totalmente o funcionamento neuropsicológico. (MEIER, et al., 2012)
Uma situação bem específica é o uso da maconha na gravidez, onde acontecem muitos aspectos negativos que são estudados e comprovados de forma intensa há alguns anos. As mães tem maior prevalência de anemia, partos prematuros e natimortos. As crianças nascem com menos peso, casos de problemas no desenvolvimento neurológico, hiperatividade, função cognitiva deficiente e mais necessidade de UTI. (MARTIN, LONGINAKER, MARK, CHISOLM, & TERPLAN, 2015) (KLINE, et al., 1991)

Os profissionais da área obstetrícia destacam que a mulher grávida tem prejuízos na utilização de bebida alcoólica, tabaco, maconha e outras drogas. Existe uma conscientização maior para suspensão, ou redução significativa, do uso de tabaco e bebida alcoólica, porém muitos usuários da maconha acreditam que fumar tal substância é apenas um “matinho” inofensivo. (RYAN, AMMERMAN, & CONNOR, 2018) (SILVA, 2018) (NPR, 2019) (SAMHSA, 2018)
No homem a produção de testosterona é diminuída sofrendo as consequências como falta do desejo sexual. Descobriu-se que o uso de maconha é capaz de promover alterações epigenéticas nos espermatozoides, afetando o desenvolvimento dos espermas, com diminuição na quantidade e tornando os gametas mais preguiçosos ou até mesmo confusos, não atingindo o óvulo, causando assim um aumento da infertilidade. (SCHROTT, et al., 2020)

E a disfunção erétil/impotência sexual, a famosa “brochada”, que atinge muitos homens, o que dizer? Apesar de alguns terem preconceito de falar sobre isso, é o distúrbio sexual masculino mais comum e há mecanismos plausíveis que ligam o uso de cannabis à impotência sexual.
Uma pesquisa realizada em vários países, com dados de 3.395 homens saudáveis, 1.035 usando cannabis (fumar) e 2.360 não usuários, constatou que a prevalência geral de disfunção erétil em usuários de cannabis foi de 69,1%, enquanto o valor correspondente nos não usuários foi de 34,7%. Os números revelam que a disfunção erétil, a famosa “brochada”, em usuários de maconha foi quase quatro vezes maior. (PIZZOL, et al., 2019)
A impotência sexual em homens está associada a uma gama substancial de efeitos adversos mentais, físicos e psicológicos. A disfunção erétil tem um efeito, muitas vezes devastador, na qualidade de vida do casal e, consequentemente, da família. Deixo um questionamento para reflexão. Como ficam os pensamentos do homem, que além de não ter quase nenhum desempenho, não consegue satisfazer sua parceira sexualmente?
Outra situação mostrada através de pesquisas é uma ligação entre o uso de maconha na adolescência e o risco aumentado de uma forma agressiva de câncer testicular. O início prematuro do câncer testicular em comparação com o câncer de pulmão e a maioria dos outros cânceres indica que, qualquer que seja a natureza da contribuição da maconha, ela pode se acumular em apenas alguns anos de uso. (LACSON, et al., 2012) (DALING, et al., 2009)
Um aspecto relevante que atinge a maioria dos usuários é o da psicose. Os usuários de maconha têm mais sintomas depressivos, uma taxa elevada de ideação suicida e quadros psicóticos. Estes efeitos são graves e com uma recorrência com o quadro de esquizofrenia, a doença considerada a mais grave da Psiquiatria. A esquizofrenia é uma doença grave e irreversível, que deteriora as respostas afetivas, funções cognitivas e a interação social. Estima-se que de 8 a 24% dos casos de psicose, em diferentes países, poderiam ser prevenidos se o consumo de maconha fosse evitado. (ARSENEAULT, et al., 2002) (VAN OS, et al., 2002) (GENTIL, 2002)
Durante a minha Pós-graduação na área de Dependência Química, questionei por diversas vezes aos Mestres/Doutores sobre a prevalência das psicoses/esquizofrenia nos países que liberaram a utilização da maconha, mas na época não existiam muitos estudos, porém nos dias atuais dezenas de pesquisas comprovam a prevalência da esquizofrenia, nos países que liberaram a maconha para utilização de diversas formas. (DEVYLDER, MITTAL, & SCHIFFMAN, 2020) (MURRAY & HALL, 2020)
Na década de 60, os Hippies com slogan da geração “Paz e Amor” usavam maconha, porém naquela época a composição da planta não tinha os níveis elevados das substâncias como nos dias atuais. Para se ter uma ideia, nesta época, um cigarrinho de maconha continha por volta de 0,5 a 1% de THC, hoje o mesmo cigarrinho pode ter 20 a 30%. Se compararmos as plantas de hoje com as do passado, podemos considerar que antigamente se fumava “matinho”. Esta seria uma das ilusões dos familiares, que utilizaram no passado, e acreditam que os seus filhos não correm riscos e até apoiam a utilização.
A maconha tem mudado consideravelmente ao longo das últimas décadas. Nos Estados Unidos, tem sido documentado um aumento do teor de THC da maconha apreendida. No início da década de 90, a média do teor de THC era de menos de 4%, passando de 15% em 2018 e chegando aos dias atuais aos 30%. Isto justifica uma maior taxa de pacientes dependentes em tão pouco tempo. (UNITED NATIONS, 2020)
Em vista das evidências científicas de utilização da maconha, torna-se imperativo que os usuários tomem consciência dos prejuízos, escolham suspender o uso e não façam apologia. Este fato deve ser incentivado em todos os âmbitos da sociedade, assegurando desta forma a segurança e a saúde de todos.
Em caso de dúvida, o melhor remédio é a informação, principalmente a informação baseada em ciência de qualidade. Se você precisa de atendimento ou deseja ter mais informações, não hesite em marcar uma consulta. Caso necessite levar tais informações para grupos, de maneira simples e lúdica, terei o imenso prazer em ministrar palestras. Seja careta: não utilize drogas.
BIBLIOGRAFIA
ARSENEAULT, L., CANNON, M., POULTON, R., MURRAY, R., CASPI, A., & MOFFITT, T. E. (2002). Cannabis use in adolescence and risk for adult psychosis: longitudinal prospective study. BMJ, 325(7374), 1212-1213. doi:10.1136/bmj.325.7374.1212
DALING, J. R., DOODY, D. R., SUN, X., TRABERT, B. L., WEISS, N. S., CHEN, C., . . . SCHWARTZ, S. M. (2009). Association of marijuana use and the incidence of testicular germ cell tumors. Cancer, 115(6), 1215-1223. doi:10.1002/cncr.24159
DEVYLDER, J. E., MITTAL, V. A., & SCHIFFMAN, J. (02 de Setembro de 2020). Balancing the Public Health Costs of Psychosis vs Mass Incarceration With the Legalization of Cannabis. JAMA Psychiatry. doi:10.1001/jamapsychiatry.2020.2591
FERGUSSON, D. M., BODEN, J. M., & HORWOOD, L. J. (26 de Maio de 2015). Psychosocial sequelae of cannabis use and implications for policy: findings from the Christchurch Health and Development Study. Soc Psychiatry Psychiatr Epidemiol, 50, 1317-1326. doi:10.1007/s00127-015-1070-x
GENTIL, V. (Setembro de 2002). Maconha e Demência Precoce. Scientific American Brasil, 26-33.
KLINE, J., HUTZLER, M., LEVIN, B., STEIN, Z., SUSSER, M., & WARBURTON, D. (Jul de 1991). Marijuana and spontaneous abortion of known karyotype. Paediatr Perinat Epidemiol, 5(3), 320-332. doi:10.1111/j.1365-3016.1991.tb00717.x
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SCHROTT, R., ACHARYA, K., ITCHON-RAMOS, N., HAWKEY, A. B., PIPPEN, E., MITCHELL, J. T., . . . MURPHY, S. K. (26 de Agosto de 2020). Cannabis use is associated with potentially heritable widespread changes in autism candidate gene DLGAP2 DNA methylation in sperm. (T. &. Francis, Ed.) Epigenetics, 15(1-2), 161-173. doi:10.1080/15592294.2019.1656158
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VAN OS, J., BAK, M., HANSSEN, M., BIJL, R. V., de GRAAF, R., & VERDOUX, H. (AGOSTO de 2002). Cannabis Use and Psychosis: A Longitudinal Population-based Study. American Journal of Epidemiology, 156(4), 319-327. doi:10.1093/aje/kwf043



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